sexta-feira, 22 de setembro de 2017

O que senti ao chegar a  Praça de Obradoiro em Santiago de Compostela?

Chegar a praça do Obradoiro em Santiago de Compostela, após percorrer cerca de oitocentos quilômetros a pé, certamente envolve emoções. Descrever tais emoções em palavras é fácil para os poetas, não é meu caso. Eu só consigo dizer que caminhei e estava em “estado de graça”, uma espécie de levitação espiritual, uma leveza da alma e do espírito, até do corpo, uma alegria infinita.
Assim, chegar a Praça, claro que me deixou satisfeita e emocionada por ter conseguido superar os desafios de todas as etapas, porém, com um sentimento de tristeza no ar. E agora? Acabou? O caminho termina aqui?
Penso que quase todos os peregrinos, com maior ou menor intensidade, passam pelo mesmo dilema, curtir a emoção da chegada ou a tristeza da partida? Foram tantos os momentos de introspecção e de vida simples, pois a rotina do caminho é sempre a mesma: despertar, caminhar, comer, dormir, não há dúvidas sobre o que fazer. Neste ínterim observar a natureza (que segundo expressão de São Paulo (Rom. 1-20), conhecer a natureza leva ao conhecimento de Deus (per visibilia ad invisibilia)[i]; não exigir nada das pessoas que estão ao nosso redor, exceto uma troca de sorrisos ao cruzarmos em algum ponto do caminho e as vezes um cumprimento “buen caminho”; dar e receber atenção. Todos estamos naquele caminho com o coração aberto, dispostos a intercambiar sentimentos e emoções. Curiosos para saber os motivos que fizeram cada um de nós, sair do conforto de nossas casas, para caminhar em terras de Espanha. Porque elegemos este caminho e não outros?
Próximo do final, surgem algumas incertezas: e agora? Como será voltar para casa?  Como enfrentar os problemas que deixamos em suspenso? Eventualmente, como voltar a uma vida que consideramos sem objetivo, vazia, sem brilho? Descobrimos que caminhar no meio de estranhos deu sentido a nossas vidas, ali fizemos amigos de várias nacionalidades, entregamos nosso coração e contamos nossos segredos para pessoas desconhecidas, estivemos abertos a novas experiências, até mesmo a sentir dor e, concluímos que o mais prazeroso foi compartilhar nosso espaço, a beleza da vida...isto deixará saudades.
Depois da chegada, podemos entrar na Catedral, abraçar a imagem do Santo, visitar o sepulcro, participar da missa do peregrino, rituais que realizamos ou não.  No meu caso, optei por fazê-los, apesar de meu objetivo no caminho não ser religioso (acho que não me afastei totalmente dos dogmas cristãos). Me emocionei, não pelos rituais, mas ao lembrar do “caminho” que trilhei na minha vida para estar presente naquele local, sentindo as energias positivas que emanavam do ambiente e de cada peregrino. Pensar nas lutas que travei na vida, os sucessos, os fracassos, as perdas de familiares e amigos queridos, é impossível que não me viessem lágrimas de emoção, as vezes copiosas, espontâneas, mas efetivamente de emoção, de gratidão pela vida, pelo caminho até aqui percorrido. O caminho continua...
Ultreya!





[i] Livro: elementos simbólicos de la peregrinación Jacobea, José Fernández Arenas, editora Edilesa Ensayo, pág. 14

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